Nesses últimos anos, anos de crise econômica externa e interna, a produção do campo brasileiro tem cumprido um papel imprescindível, tanto ao garantir a comida na mesa das famílias, como ao colaborar expressivamente para equilibrar os resultados da balança comercial. Em 2014, o campo literalmente salvou o Brasil de um desastre nas contas externas: o déficit comercial brasileiro, de 4 bilhões de dólares, teria alcançado a soma estratosférica de 84 bilhões de dólares, não fosse a contribuição da produção agropecuária, que conseguiu um saldo positivo de 80 bilhões de dólares.
Para continuar produzindo alimentos, riquezas e divisas, entretanto, nossos verdes campos precisam de alguns insumos básicos. Muitos deles são óbvios, e reconhecidos por todos: sementes, adubo, água, financiamento, infraestrutura de escoamento. Há um insumo, entretanto, tão importante que, sem ele, todos os outros se tornam insuficientes, e este não é tão facilmente identificado, principalmente por aqueles que não vivem nem trabalham no campo: a paz.
Garantir a paz no campo significa pôr um fim nos históricos conflitos fundiários que colocam, de um lado, as populações indígenas originárias, ocupantes primeiras do território, com sua economia comunitária, e, de outro, os proprietários rurais, responsáveis pelos continuados recordes de produção alcançados pelo agronegócio. Os conflitos, com variado grau de violência, eclodem de tempos em tempos em todo o País, embora com maior visibilidade em alguns estados, como é o caso do meu Mato Grosso do Sul, que, além de ser um dos mais importantes estados produtores, é também aquele que detém a segunda maior população indígena do Brasil.
Esses conflitos sem-fim produzem um estado geral de instabilidade – social, econômica, jurídica – que afeta a todos, índios e não-índios, que se vêm impedidos de conduzir normalmente suas atividades produtivas e mesmo suas vidas cotidianas. Índios expulsam brancos. Brancos expulsam índios. Mulheres e crianças indígenas têm medo de circular pelas cidades. Moradores das cidades passam a temer a ocupação de suas casas. Essa situação é fruto da omissão do Poder Público, em todos os seus níveis. Cabe ao Poder Público, incluído aí, obviamente, o Congresso Nacional, encontrar e implementar o caminho da pacificação.
Conscientes disso, os senadores sul-mato-grossenses, num trabalho conjunto como representantes de todos os brasileiros que vivem, produzem e sonham em Mato Grosso do Sul, lutamos em favor da pronta tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 71, apresentada originalmente pelo Senador Paulo Bauer em 2011. Relatada primeiro pelo saudoso Senador Luiz Henrique, a matéria foi brilhantemente defendida, em sua redação final, pelo Senador Blairo Maggi. Esse foi o texto que tive a honra de ajudar a aprovar no dia 8 de setembro (um dia depois do feriado da Independência). A PEC segue agora à apreciação da Câmara dos Deputados.
O texto aprovado, que espelha o amadurecimento alcançado por todas as partes envolvidas (indígenas, proprietários e os órgãos e autoridades do Estado), parte da premissa de que a demarcação das terras indígenas é direito constitucional, assim como o é o direito de propriedade dos proprietários de boa-fé – estão excluídos, portanto, os grileiros e invasores de vária espécie. A solução adotada é ao mesmo tempo simples e eficiente: reconheçam-se e demarquem-se as terras indígenas tradicionais, e indenizem-se as famílias que adquiriram honestamente propriedades nessas terras, inclusive com títulos concedidos e reconhecidos pelo Poder Público.
Ao estabelecer que a indenização deve se dar – previamente e em dinheiro – correspondendo ao valor da terra nua e das benfeitorias nela realizadas, a PEC assegura o justo ressarcimento a quem detém o legítimo direito à propriedade, eliminando assim o maior obstáculo à desejada pacificação.
O Brasil é grande, nele cabem todas as etnias, todas as culturas, todas as formas de propriedade e de produção. É minha convicção que a PEC 71/2011 traz importante contribuição para que o campo brasileiro, ao invés de queimar em conflagrações intermináveis, possa cumprir o seu destino de produtor – de riquezas, sim, de alimentos, certamente, mas, principalmente, de relações pacíficas entre irmãos, entre homens e mulheres de boa vontade que reconheçam que a maior riqueza que possuímos é a diversidade que nos constitui desde os primórdios de nossa História.
Os tempos estão maduros para a colheita da paz.
Assessoria de Imprensa