Senadora avalia que equipe econômica é obrigada a “fazer política” para conter problemas causados por Bolsonaro e seus filhos
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) ascendeu ao posto de presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado após ter desempenhado papel importante para a derrocada de seu correligionário Renan Calheiros (MDB-AL) no comando da Casa. Com isso, sua imagem de enfrentamento de velhos caciques da política começou a se firmar logo no início do atual governo.
Hoje, ela se diz independente da administração de Jair Bolsonaro (PSL) e tenta imprimir uma nova marca ao MDB, legenda que participou de todas as gestões federais desde a redemocratização do país e que sustenta a fama de ser governo, independentemente de quem seja o ocupante do Palácio do Planalto.
“Não sou governo”, garantiu a senadora em entrevista ao Metrópoles. Em consonância com a atual administração federal, no entanto, ela tem uma preocupação com a pauta econômica e diz tentar imprimir um “trabalho paralelo” na CCJ do Senado, com o objetivo de “fazer a roda da economia girar”.
Simone Tebet não poupou críticas ao presidente Jair Bolsonaro (PSL), embora reconheça qualidades no time econômico escalado pelo atual chefe do Executivo federal. “Hoje, a meu ver, a equipe econômica está fazendo política, coisa que não é papel dela. Está fazendo política, acertadamente, porque temos um presidente da República que, quando fala, cria crise econômica e política no país”, avaliou.
O papel do Paulo Guedes e de sua equipe econômica, o do próprio Marinho [Rogério Marinho, secretário especial da Previdência] na Previdência, eram papéis institucionais, mas técnicos. Eles estão avançando (a meu ver, positivamente) o sinal porque estão precisando apagar o fogo da parte econômica do governo que não está funcionando“
Enquanto a Câmara se debruça sobre as prioridades do governo – reforma da Previdência e pacote anticrime –, Simone Tebet encaminhou na comissão que preside no Senado as votações de admissibilidade das propostas de criação do cadastro positivo e da Empresa Simples de Crédito (ESC), além de outras medidas cujo objetivo é “desburocratizar” a economia.
Foto: Rafaela Felicciano / Metrópoles
“A prioridade é a pauta econômica, independentemente de a reforma da Previdência estar aqui ou não”, avisou. “É fazer avançar todos o projetos que atendam aos interesses do país e da própria equipe econômica do governo, embora eu não seja governo”, enfatizou.
Na avaliação da senadora, as declarações polêmicas do presidente da República são o principal entrave ao andamento dos interesses do governo no Congresso. “Hoje isso paralisa o trabalho da Câmara. Nós estamos avançando, mas independentemente do governo”, destacou.
“Acho que está faltando coordenação, foco naqueles pontos prioritários e começar a dialogar com o Senado naqueles projetos que estão parados e que são estruturantes”, observou. “Como a CCJ é o coração e o pulmão dos trabalhos do Senado, se nós não formos ágeis, tudo para, principalmente no primeiro ano, no qual houve uma troca muito grande de senadores. Muitos projetos vão para o arquivo e outros ressurgem – até, de certa forma, copiados de projetos arquivados”, completou a parlamentar.
Filhos do presidente
Além da postura do presidente, a senadora ainda considerou que a existência de um “quarto núcleo” no governo, formado pelos filhos de Jair Bolsonaro, tem atrapalhado ainda mais os rumos do país. “Os filhos estão atrapalhando mais do que o pai”, disparou.
“O governo tem três núcleos: o econômico, o político e o militar. Não vejo problema nenhum nisso, no fato de os militares estarem no governo”, avaliou. “Estamos na UTI. Temos um país moribundo, prestes a chegar em um momento de shutdown. Mas nunca tivemos um presidente da República, um chefe de Executivo no Brasil, nem antes da ditadura, com um quarto núcleo, no qual os filhos mandam no país”, avaliou a senadora.
“Normalmente, quem quer, inclusive, mostrar autoridade como capitão e defensor do conservadorismo – e de parte desse conservadorismo eu até comungo – não pode mostrar o contrário no poder. O pátrio poder é do pai e é da mãe”, disse. “O que se vê é o processo inverso, os filhos comandando, mesmo tendo consciência de que há outros núcleos falando, interferindo. Não deixando o presidente governar”, avaliou Simone Tebet.
A senadora afirmou ainda que falta a Bolsonaro deixar a sua marca no conjunto de mudanças nas aposentadorias. “O presidente tem que colocar a digital na reforma da Previdência e, enquanto ele não fizer isso, a Câmara não vai votar. Enquanto ele não comandar o partido dele e disser que é para votar – ‘eu preciso de vocês’ – e conversar com o centro, com a esquerda, dialogar, vir ao Congresso, colocar esta questão muito clara, a reforma não será aprovada”, considerou a emedebista.
Caciques
Filha de Ramez Tebet, Simone viu seu pai ser senador, presidente do Senado, ministro e governador de Mato Grosso do Sul. Ela chegou à Câmara Alta do Parlamento brasileiro forçando prévias em seu partido para a escolha do presidente da Casa, contrariando a tradição emedebista de definir o candidato por aclamação. Contrariou interesses de políticos contemporâneos de seu pai, como o senador Renan Calheiros, que tentou neste ano presidir o Senado Federal pela quinta vez.
Como resultado do movimento liderado por Simone Tebet, Renan perdeu a disputa pelo cargo, assumido, em uma conturbada eleição, pelo senador Davi Alcolumbre (DEM-PA), com quem ela tem atuado diretamente na condução dos trabalhos.
“É importante ter uma linha muito rápida de comunicação com o presidente do Senado, saber o que está acontecendo, para que a CCJ seja um instrumento para agilizar os trabalhos no plenário”, argumentou a parlamentar.
Imagem de independência
A senadora tem divulgado a intenção de reforçar uma imagem de independência do MDB. Para ela, a renovação nos quadros do partido, em contraposição aos velhos caciques, é o único caminho para a legenda não se tornar uma sigla média ou pequena nos próximos anos.
“Já disse isso para o próprio presidente do partido [Romero Jucá (MDB-RR)] e deixei as coisas muito às claras. Disse que entendia haver uma necessidade muito grande de renovação”, contou. “Se não nos reinventarmos, vamos deixar de ser o maior partido do Brasil, que ainda somos só por conta das eleições municipais, e vamos virar um partido mediano ou até pequeno”, avaliou.
Disputa interna
Nesse contexto, a senadora também passou a encabeçar um movimento no processo de sucessão dentro do MDB, contrária à possível candidatura do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, à presidência nacional da legenda.
Ibaneis é considerado “o novo” pela atual cúpula emedebista, que deseja se manter no comando do partido. Em contraposição a isso, lideranças de estados do Sul do país já ensaiam outro nome para a disputa, com o objetivo de tirar o controle da legenda das mãos do ex-senador José Sarney, do próprio ex-presidente Michel Temer, de Renan Calheiros e de Romero Jucá.
“Eu alertei o presidente do partido de que não terá o meu apoio o candidato a presidente que, embora seja um nome novo, não comunga das atuais ideias. Ele [Ibaneis] não falou das suas ideias, mas, se ele não significar o novo, não terá o meu voto”, disse Tebet. “Não basta ser um nome novo”, completou.
Aliados da senadora nessa empreitada são o senador Dario Berger e o deputado Celso Maldaner, ambos do MDB-SC. Ela, no entanto, se negou a ser o nome a enfrentar os caciques nas eleições internas.
“Já fui procurada por vários colegas, mas acho que minha cota de participação eu já dei. Acho que abri caminho, ajudei a construir uma ponte para esta travessia”, enfatizou. “Eu ajudei a mudar, tanto é que, pela primeira vez, nós não somos governo”, observou Simone Tebet.
Fonte: Metrópoles