Candidata à presidência do Senado pelo MDB defende que governo sugira em até um mês uma proposta de novo benefício assistencial
Por Renan Truffi — De Brasília
Candidata à presidência do Senado pelo MDB, maior bancada da Casa, a senadora Simone Tebet (MS) está incomodada com a tentativa do governo Jair Bolsonaro de “ingerir” na disputa interna do Congresso Nacional. Em entrevista ao Valor ontem, Simone disse que a intromissão do Palácio do Planalto nas eleições do Legislativo “não é saudável” para os Poderes.
Na avaliação da parlamentar, o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), seu rival na disputa e que é apoiado pelo Executivo, terá “muitas dificuldades” para dizer “não” a Bolsonaro em função dos compromissos firmados.
Simone afirmou não vê apelo popular para um impeachment do presidente, de quem cobra uma nova proposta de auxílio emergencial. A senadora defendeu que o debate sobre esse benefício não pode estar atrelado à aprovação da PEC Emergencial.
“Não consigo entender essa ingerência numa eleição do Senado Federal. Tem dois candidatos que votam com o governo na pauta econômica, dois candidatos que não são oposição, aliás, votaram muito parecidos no projeto. Votei até mais com o governo do que o meu próprio concorrente. Essa ingerência do governo na eleição do Senado ela não é saudável, não tem razão de ser”, criticou.
Simone falou sobre o assunto ao comentar o suposto favoritismo de seu adversário na disputa. Isso porque Rodrigo Pacheco tem hoje o apoio de oito partidos, base que é suficiente para lhe dar os 41 votos necessários para a vitória. “O que eu sei é que só se ganha a eleição após o fechamento das urnas e a proclamação do resultado”, respondeu.
A senadora defendeu que, apesar de representar uma candidatura independente, o governo não deveria se preocupar com sua possível eleição e nem cometer atos de ingerência como estaria fazendo até agora.
Sobre isso, fez um alerta: haverá consequências se o Congresso escolher o “candidato oficial”, como se referiu ao senador do DEM, para comandar os trabalhos na Casa. “Vejo na figura de um candidato oficial do governo muito mais dificuldade de dizer não ao presidente porque há compromissos que são firmados”, defendeu. Neste sentido, a senadora procurou se diferenciar. Disse que sua gestão terá como marca ouvir o sentimento da maioria dos parlamentares da Casa e que o Parlamento brasileiro está diante de uma “encruzilhada” neste momento.
“Quem conhece meu passado, minha história, sabe que tenho opiniões muito próprias, muito determinadas, mas que não faça nada sem ouvir o sentimento da maioria [do Senado]”, argumentou. “Estamos diante de uma grande encruzilhada econômica e
social para falarmos em divisões. Minha candidatura não é contra ‘A’ ou ‘B’, mas a favor do Brasil, o que significa a favor do estado democrático de Direito”, disse a parlamentar.
A senadora do MDB rechaçou qualquer possível aceno do DEM para uma composição com o seu partido neste momento da disputa, como vem sendo especulado nos últimos dias. O movimento teria como “bandeira branca” a oferta da vice-presidência
da Casa ao partido. Em troca, os emedebistas retirariam a candidatura de Simone da disputa, possibilidade que ela afasta completamente.
“O tempo do consenso já passou há muito tempo, [passou] quando o presidente Davi Alcolumbre não chamou os líderes do MDB, maior bancada do Senado, para dialogar e buscar um nome de consenso dentro do Senado, e sim um nome oficial do governo federal”, afirmou. “O MDB não lançou candidatura própria só por ser a maior bancada ou por tradição. O MDB optou por lançar candidatura quando viu que a ingerência de um poder sobre o Legislativo feria o Estado democrático de direito.”
Mas, mesmo com essa interferência, Simone é mais comedida quando o assunto é a possibilidade de um impeachment do presidente Jair Bolsonaro. A candidata acredita que os apelos que reverberam até o momento estão “contaminados” pela negligência do governo em torno da vacina contra a covid-19. Apesar disso, afirma ela, as pesquisas mostram que a maioria da população não quer a destituição de Bolsonaro do cargo, o que é fundamental para que algum movimento seja feito por parte da Câmara dos Deputados.
“Não existe impeachment no Brasil sem apelo popular”, enfatizou. “Temos que nos pautar pela última pesquisa [de opinião] e ela mostra que a maioria da população brasileira não quer o impeachment. Isso bate muito forte na Câmara dos Deputados, que é quem inicia esse processo. Hoje não vejo esse apelo popular estimulando qualquer abertura de impeachment”, resumiu.
Do ponto de vista econômico, começam a surgir algumas diferenças entre Simone e o governo federal. Na conversa, a candidato do MDB criticou a possibilidade de o Palácio do Planalto condicionar apoio ao novo auxílio social à aprovação das propostas de Emenda à Constituição (PECs) do Mais Brasil, conhecidas como PEC Emergencial e PEC dos Gatilhos. A ideia da gestão Bolsonaro seria forçar esse acordo como forma de abrir espaço no Orçamento para essa despesa.
“Não vejo problema de um compromisso do Congresso de pautar as duas matérias [auxílio e PECs]. Mas não dá para dar garantia [de aprovação] ao governo”, defendeu.
“Não dá pra assumir compromisso de que as PECs serão aprovadas da forma como estão. Tem pontos impopulares, excessos e isso pode ser modificado”, acrescentou. Além disso, a parlamentar do MDB defendeu que o governo precisa sugerir, em até 15
ou 30 dias, uma proposta de novo benefício assistencial para aqueles que continuam sendo afetados pela pandemia. “Eu acho que é impossível conter o apelo do Congresso para uma pauta como essa. Vai vir da rua e chegar nos ouvidos dos parlamentares, como está chegando. Por isso, não consigo imaginar o governo não apresentando alguma proposta nos próximos dias”, acrescentou.
Ainda assim, a discussão sobre o novo auxílio, seja de R$ 200 ou R$ 300, terá de se dar dentro dos “limites” fiscais, argumentou, “sob pena de entrarmos num verdadeiro buraco negro”. “Os momentos de crise são os momentos menos propícios a qualquer alteração no que se refere à política fiscal, é temário”, alertou. Simone ainda demonstrou otimismo sobre o avanço da reforma tributária, mas pouca confiança em relação às privatizações por conta da crise. “Vai ficar para um segundo
plano.”
Fonte: Valor Econômico